News

28 de novembro de 2021

Estejam preparados para mais inflação e volatilidade, diz Rodrigo Azevedo

A inflação já se tornou – e será cada vez mais – o grande foco dos mercados. Essa é a visão de Rodrigo Azevedo, sócio-fundador e CIO da área macro da Ibiuna Investimentos, uma das gestoras mais conceituadas do Brasil, com 24,1 bilhões de reais sob gestão.

Azevedo, ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, argumenta que a escalada da inflação será uma barreira difícil de superar e que os gestores devem estar prontos para um cenário de turbulência tanto no Brasil quanto nas bolsas do exterior.

“O movimento de alta da inflação será maior, mais disseminado e mais persistente, acima até mesmo do que dizem as estimativas mais recentes. A mensagem é que os gestores precisam estar preparados para um ambiente bastante volátil, que vai surpreender os otimistas”, defendeu Azevedo em entrevista à EXAME Invest.

Para lidar com o cenário mais desafiador, a estratégia dos produtos macroeconômicos da casa tem sido buscar oportunidades em inflação e juros em 30 países. Os resultados já apareceram neste ano: o fundo multimercado Hedge STH, carro-chefe da casa, registrou um retorno de 10,8% em 2021, superando o benchmark, o CDI, em 325% até agora.

Parte dos retornos veio de apostas na alta da inflação brasileira, mas, para os próximos meses, a Ibiuna prefere manter a maior parte de seu portfólio em ativos no exterior. Na visão da gestora, o país deve ser um dos mais afetados no cenário de alta volatilidade que se avizinha.

Veja abaixo a entrevista completa com Rodrigo Azevedo, sócio-fundador e CIO da área macro da Ibiuna Investimentos, sobre os desafios para a a economia brasileira e a estratégia da gestora:

Desafios para o Brasil
Quais as perspectivas para o Brasil no atual cenário macroeconômico?

Será bastante desafiador. Existem aspectos internos e externos que vão colocar desafios importantes para os gestores de política econômica no Brasil no próximo ano.

Começando pela parte externa: estamos passando por um período de transição de política monetária no mundo inteiro, que responde a tendências de inflação mais disseminadas e persistentes. Nos Estados Unidos, a perspectiva é que o Fed faça uma transição para um período de aperto da política monetária em meados do ano que vem. As consequências são a desaceleração do crescimento e a menor disponibilidade de fluxos para ativos de risco, incluindo países emergentes.

Sob certos aspectos, o período que se seguiu à Covid trouxe ventos externos muito favoráveis para o Brasil: muita liquidez, juro baixo, o mundo acelerando e puxando preços de commodities.

Agora esses ventos estão gradualmente virando e deverão ficar mais contrários em 2022. Os países emergentes que não estiverem com seus fundamentos sólidos tendem a sofrer mais.

O Brasil não está com seus fundamentos sólidos? Quais são os desafios internos para o país?

Do ponto de vista interno, existem dois grandes desafios. O primeiro é conter a alta da inflação e assegurar que ela convirja de volta para as metas. Temos, neste ano, uma inflação que, no nosso entender, vai se situar próximo a 10,3%, ficando em 5% em 2022. Isso demanda uma política monetária bastante apertada, com juros que se situem próximos a 12% pela maior parte do ano que vem.

É uma medida necessária para conter a inflação, mas que tem consequências do ponto de vista de crescimento, uma vez que o PIB estará bem mais fraco do que o de 2021.

O segundo desafio é assegurar a credibilidade da sustentabilidade da dívida pública no meio de um processo eleitoral. Nesse cenário, estabelecer um compromisso como reforço de um mecanismo alternativo ao teto de gastos é importante.

Qual a sua avaliação sobre a decisão do governo de mudar a regra de funcionamento do teto de gastos? Qual seria a melhor alternativa para estabilizar as contas públicas?

Ao remover total ou parcialmente o teto de gastos, o governo comprometeu a credibilidade desse instrumento como garantidor de que o ajuste fiscal nas contas públicas seria feito ao longo do tempo. E, como não foi colocado nada igualmente crível no lugar, o resultado é que os prêmios de risco voltaram a subir.

O teto foi criado como uma regra rígida para que ele fosse crível. Mas quando essa regra passa a ser facilmente modificada, é difícil achar que qualquer regra vai trazer essa credibilidade. O mais importante é que o governo – e sua base no Congresso – que esteja implementando a política fiscal tenha de fato um compromisso com a responsabilidade fiscal. Isso é tão ou mais importante do que o mecanismo específico do teto de gastos.

O atual governo seria capaz de garantir essa mudança ou seria necessário uma mudança para 2023?

O atual governo, junto com a atual base no Congresso, já mostrou que é possível arrumar os votos necessários para liberar mais gastos. É muito difícil recuperar o teto de gastos com essa combinação [na condução do país] neste momento.

Já 2023 está em aberto. A grande pergunta é qual será o regime macroeconômico que vigorará no país a partir de 1º de janeiro de 2023. Essa é uma questão que vai dominar o debate no próximo ano e é o que, de fato, vai decidir a trajetória dos ativos do Brasil.

A estratégia da Ibiuna
O fundo multimercado Hedge STH, carro-chefe da casa, registrou um retorno de 10,8% em 2021, superando seu benchmark, o CDI, em 325% até agora. Qual foi a estratégia da gestora para alcançar esse resultado?

O tema principal que nós temos explorado neste ano é a volta da inflação no Brasil e no mundo. É uma tese que vem basicamente de uma reflexão de que, no ano passado, houve um relaxamento generalizado de política monetária em todos os lugares do mundo, e que as economias, em geral, surpreenderam. Isso colocou pressões de demanda sobre commodities e sobre vários produtos que estavam com baixos estoques. O resultado é que a inflação está se mostrando mais alta e mais disseminada do que se imaginava seis ou doze meses atrás.

Então, nossa estratégia é, basicamente, procurar mercados para comprar estimativa de inflação (inflação implícita) ou para adotar posições tomadas em taxas de juros. Ou seja, são investimentos que se beneficiam se os juros na curva de juros subirem. Fizemos bastante dinheiro neste ano em posições tomadas em inflação no Brasil e com posições tomadas em juros no Chile, no México, na Polônia, na República Checa, na Europa e nos Estados Unidos.

Eu acho que a bolsa está certamente bem mais atrativa. Mas, de uma maneira geral, mesmo que a gente tenha preços atrativos em renda variável, ou que o câmbio pareça bastante depreciado, o período à frente será de muita volatilidade.

Isso significa que mesmo essas posições mais descontadas vão demorar para conseguir gerar retornos consistentes. Hoje, acho que fora do Brasil temos melhores oportunidades de risco-retorno do que aqui.

E qual a perspectiva da Ibiuna para o câmbio?

Os Estados Unidos provavelmente vão começar a subir os juros em meados de 2022, e a alta deve acontecer mais cedo e ser mais forte que as elevações em outras regiões, como a Zona do Euro. Isso provavelmente levará a um fortalecimento global do dólar, um ambiente em que não é positivo ter exposição em mercados emergentes. Estamos bastante defensivos com a exposição a moedas emergentes nesse ciclo, e isso inclui o real brasileiro.

Pensando nessa alta de juros nos EUA, como vocês enxergam o mercado de renda variável americano? Deve ficar menos atrativo?

Nós antecipamos que o mercado vai estar mais preocupado com isso a partir de meados do primeiro trimestre do ano que vem. Até lá, nós continuaremos vendo um ambiente de condições financeiras extremamente relaxadas em uma economia que vem mostrando resiliência no seu crescimento. Continuamos gostando das ações nos Estados Unidos, achamos que até o final deste ano e o começo do ano que vem ainda teremos uma perspectiva de alta bastante significativa.

Quando chegar o momento, vamos reavaliar nossa posição. Mas já é possível dizer que o ano de 2022 será muito mais volátil também para a bolsa americana.